sábado, 23 de junho de 2012

Os olhos de Isa - I

Festejo o teu corpo com uma chuva de lâmpadas
e rosas clandestinas.
E amo-te.
Incendiando nas praias do meu sangue
esses pássaros que nascem no teu peito
e fazem ninho nas minhas mãos abertas.


Assim me despertas e fascinas.


E tudo em mim estremece. Tudo se desenraíza
como as grandes árvores que a tempestade sacode
e arranca no inverno, investindo sobre elas
com os seus cabelos de água, os seus cornos vermelhos.


Ó meu amor, meu amor, meu amor,
morro nos teus braços e renasço me ti
para de novo procurar-te em todos os minutos
percorrendo todos os rios, todas as aldeias do teu corpo
até chegar à tua boca, cheio de sede, ávido de ti,
depois de me perder no deserto branco da tua pele. 


Amanheço sem rosto e sem braços, completamente nu,
deixando que doas em mim como um mistério
como se o teu ventre pudesse ser a minha boca
como se eu nascesse de ti para te amar e me esquecer.
E levanto-me
e bato a todas as tuas portas (afinal as minhas)
e tu não me respondes. Percorro todos os corredores
do teu silêncio e não te encontro em nenhuma parte.
Grito por ti até sentir o sabor do sangue nos meus lábios.
Atiro-me contra as barreiras que me separam de ti
e aí adormeço, cansado, como um náufrago
e então és tu, são os teus braços a minha praia
a minha longínqua, doce e estranha praia
onde me aqueço e deito
onde enlouqueço à tua espera.


Ó meu amor, meu amor, meu amor, 
foste sempre o meu poema, a minha canção de gesta,
a minha certeza e a minha dúvida,
o meu vinho e o meu cálice.


Tu és no meu país deserto a última rosa.


Inventei-te em delírio. E trago-te em mim
por entre os mortos exilados que caminham comigo pelas ruas.
Trago-te levantada nas minhas mãos como a única espada
para vencer o mundo.
A minha pedra absoluta.
A minha eterna sede.
A minha ilha.


Ó meu amor, meu amor, meu amor. 


Joaquim Pessoa 

2 comentários:

mfc disse...

Ler Joaquim Pessoa é sentir intensamente tudo a que ele nos transporta!
"percorrendo todos os rios, todas as aldeias do teu corpo..."
Será que se pode dizer o amor de uma forma mais bela e tão intensa ao mesmo tempo?!
Beijinhos por esta escolha, Blackye

(Blackye, o pseudónimo de uma pessoa sensível)

M* disse...

O nome Blackye é baseado no livro "Black Beauty", o cavalo negro de Ana Sewell. Uma história que eu sempre amei, desde pequena, por isso, sim... Blackye é um pseudónimo de alguém bastante sensível :)
Beijinho a alguém sensível também para o compreender.*