segunda-feira, 2 de julho de 2012

Um génio a falar de amor....


Amo como o amor ama

"Amo como o amor ama. 
Não sei razão pra amar-te mais que amar-te. 
Que queres que te diga mais que te amo, 
Se o que quero dizer-te é que te amo? 

Quando te falo, dói-me que respondas 
Ao que te digo e não ao meu amor. 

Ah! não perguntes nada; antes me fala 
De tal maneira, que, se eu fora surda, 
Te ouvisse todo com o coração. 

Se te vejo não sei quem sou: eu amo. 
Se me faltas [...] 
... Mas tu fazes, amor, por me faltares 
Mesmo estando comigo, pois perguntas — 
Quando é amar que deves. Se não amas, 
Mostra-te indiferente, ou não me queiras, 
Mas tu és como nunca ninguém foi, 
Pois procuras o amor pra não amar, 
E, se me buscas, é como se eu só fosse 
Alguém pra te falar de quem tu amas. 

Quando te vi amei-te já muito antes: 
Tornei a achar-te quando te encontrei. 
Nasci pra ti antes de haver o mundo. 
Não há cousa feliz ou hora alegre 
Que eu tenha tido pela vida fora, 
Que o não fosse porque te previa, 
Porque dormias nela tu futuro. 

E eu soube-o só depois, quando te vi, 
E tive para mim melhor sentido, 
E o meu passado foi como uma 'strada 
Iluminada pela frente, quando 
O carro com lanternas vira a curva 
Do caminho e já a noite é toda humana. 

Quando eu era pequena, sinto que eu 
Amava-te já longe, mas de longe... 

Amor, diz qualquer cousa que eu te sinta! 
— Compreendo-te tanto que não sinto, 
Oh coração exterior ao meu! 
Fatalidade, filha do destino 
E das leis que há no fundo deste mundo! 
Que és tu a mim que eu compreenda ao ponto 
De o sentir...?"


Fernando Pessoa

1 comentário:

mfc disse...

Ele sabia decifrar a necessidade do amor como poucos!
Beijinhos,